Este caso, que tem tido destaque em todos os meios de comunicação, vai servir para saber se em Portugal (e no mundo), ainda há subordinação do poder económico ao poder político. Para mim, as coisas são simples: temos uma empresa multinacional (a FIFA) que obriga as federações de futebol nacionais - entidades públicas - a manterem uma norma que pune com a despromoção o facto de um clube recorrer aos tribunais. Ora, que eu saiba, o recurso aos tribunais e o acesso à justiça são direitos fundamentais que não podem ser restringidos por qualquer empresa. E a ameaça de despromoção é com certeza uma restrição intolerável.
Não ponho em causa que o Gil deve ser castigado se inscreveu irregularmente um jogador. E nem me choca que a penalização por esse facto fosse a despromoção. (à parte: claro que quando foi a Académica e o poderoso guimarães com o caso N'Dinga, não houve despromoção nenhuma do vitória... Mas, como em tudo, há os poderosos - guimarães e gil vicente - e os enteados...)
Agora sendo a causa de despromoção o recurso à jurisdição nacional soberana, espero sinceramente que o Gil tenha a maior sorte e force a FIFA a prescindor desta norma, profundamente inconstitucional. Quer através dos tribunais portugueses como nas instâncias europeias.
segunda-feira, 11 de setembro de 2006
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A Federação dispõe de normas próprias, normas que foram aprovadas e unanimemente consideradas legais, entre as quais a que sanciona com a descida de divisão o recurso aos tribunais comuns em determinadas circunstâncias. Isto não ofende a soberania do estado e dos tribunais, só a verdade desportiva. Era ao Gil Vicente que competia conhecer as regras.
ResponderEliminarPois, taralhoca, mas nem todas as normas são conformes à Constituição. E essas podem ser declaradas nulas, com força obrigatória geral, apagando-se todos os seus efeitos. Assim decidirão os tribunais, assim se fará Justiça.
ResponderEliminarPensa tu, taralhoca, que determinada associação, pública ou não, decidia que não podias exprimir-te livremente. Também dirias que era a ti que competia conhecer as regras?
Nem todas as regras são válidas. E aqui temos uma regras manifestamente inconstitucional. Mas, segundo penso, o futura dar-me-á razão...
Afonso não concordo nada contigo e quase que aposto que o futuro não te vai dar razão.
ResponderEliminarNa minha opinião o que aqui se passa é muito simples e não ofende minimamente a constituição ou qualquer outra lei com força obrigatória geral.
A FIFA enquanto associação desportiva recebe no seu seio diversas federaçãoes nacionais de futebol, entre as quais a nossa FPF, as quais se encarregam de, elas próprias ou outros organismos nacionais, organizar os diversos campeonatos nacionais de futebol.
Como é lógico, os clubes que livremente optam por participar nessas competições têm uma série de responsabilidades e de deveres que se obrigam a cumprir, sob pena de sofrerem sanções mais ou menos pesadas.
Uma dessas regras é a de não haver recurso possível, em relação a matérias de cariz estritamente desportivo, aos tribunais comuns; o que se compreende: imagina o que seria os clubes andarem a recorrer para tribunais comuns de todos os cartões amarelos que levam num jogo, ou das penalizações dos jogadores.
Seria incomportável até porque o timing dos Tribunais comuns não se coaduna com as exigências de rapidez de decisão em termos desportivos.
Ora, o Gil Vicente recorreu aos Tribunais comuns numa matéria que eu considero (bem como os 6 magistrados do CJ da federação e do CD da Liga) de cariz estritamente desportivo, ou seja, recorreu da decisão de não deixar inscrever um jogador, o tal Mateus (que já é mais famoso que o próprio São Mateus da Bíblia).
E não se venha dizer que com isto se está a limitar um direito fundamental (o do acesso à justiça e aos tribunais) porque não é verdade: o Gil podia ter recorrido desta decisão do CJ da federação para o Tribunal Arbitral Internacional do Desporto em Lausane, na Suiça, mas não o fez; por outro lado, todos nós sabemos que em muitas situações diversos sujeitos se aceitam submeter a Tribunais Arbitrais para a resolução de conflitos renunciando expressamente a recorrer aos Tribunais Comuns da decisão que aí for proferida.
É exactamente isso que se passa aqui: o Gil, ao aceitar e subscrever os regulamentos da Liga, impostos pela FIFA, renunciou ao seu direito de recorrer aos tribunais comuns em materia estritamente desportiva, como muitos sujeitos particulares diariamente fasem.
Se não queria aceitar estas regras não se sujeitava a elas e participava em campeonatos do INATEL, podendo recorrer de todas as decisões para os tribunais.
Estão a ser muito mal aconselhados e temo que estejamos perante o fim deste clube.
Depois de ler o meu comentário reparei que escrevi "fasem" e não fazem como queria escrever. A todos as minhas desculpas e aqui vai a correcção
ResponderEliminarCaramba, depois de um comentário com o qual concordo em pleno, estava a ver que te tinha de puxar as orelhas por uma questão linguística! ;)
ResponderEliminarOh Magalhães, não podia discordar mais.
ResponderEliminarEsse exemplo que deste é o pleno exemplo de restrição inaceitável a um direito fundamental. Daqui a pouco, estamos a permitir a inclusão em cláusulas contratuais da impossibilidade de descussão judicial do contrato. E depois sempre podemos dizer "QUem contratou conhecia as regras: não contratasse"...
A renúncia a direitos fundamentais, como sabes melhor que eu, não é admitida plenamente. Aceita-se apenas uma auto-restrição que não ponha em causa o núcleo essencial do direito. Mas essa auto-restrição só pode ser admitida nas relações entre iguais: entre privados. Aqui há a intervenção de uma autoridade pública, dotada de poderes exorbitantes. Nesta caso, nao pode jamais aceitar-se que um privado abdique de um direito fundamental como contrapartida para o exercício de outros dois direitos fundamentais: a prática desportiva e a iniciativa económica.
E nem se diga que podia ter recorrido a tribunais arbitrais... Os árbitros não são juízes. E a soberania não se exerce através de um tribunal contratado. Tanto é assim que a existência de compromissos arbitrais não exclui a competência dos tribunais soberanos...
Porque o recurso a uma justiça pública é essencial para o Estado de Direito.
Por fim, quanto à questão técnico-desportiva. Oh Magalhães, onde é que arguir a simulação de um contrato de trabalho de contínuo com o Lixa é uma questão técnico-desportiva? Desculpa, mas se assim for estudámos "Desporto" e não direito... Porque eu aprendi a simulação como figura jurídica. E foi isso que o Gil Vicente foi discutir: que o contrato do Mateus como contínuo era simulado, pelo que o jogador era já um profissional...
Antes de me contradizeres, pensa lá se não tenho razão. Admitir esta restrição, é admitir que se coloque uma cláusula em todos os contratos excluindo o direito de ir para tribunal. Quem nao quiser contratar que nao contrate...
Afonso, tal como pediste, pensei bastante antes de te responder para poder analisar toda a argumentação que verteste no teu comentário; e depois de pensar e repensar continuo a achar que nesta situação não existe violação nenhuma de direitos fundamentais.
ResponderEliminarDesde logo porque, repito, a restrição de recurso aos tribunais comuns diz respeito a questões com carácter estritamente desportivo, o que faz todo o sentido, como eu disse, atendendo à celeridade que se impõe na justiça desportiva e que não é compatível com a celeridade (ou falta dela) inerente à jurisdição comum.
Por outro lado, esta restrição faz também sentido porque estaríamos a colocar questões eminentemente técnicas ao livre arbítrio de pessoas que não possuem conhecimentos técnicos capazes de garantir uma resposta precisa e adequada, sobretudo se atendermos à celeridade com que essa resposta teria de ser dada, uma vez que os juízes não iriam dispor de tempo para estudar a questão, como muitas vezes nos é dito nos tribunais.
Em terceiro lugar, porque, a admitir tais recursos aos tribunais comuns sobre matérias estritamente desportivas, estariamos a contribuir para um entorpecimento ainda maior da já lenta jurisdição comum (vejamos o que aconteceria se todos os clubes decidissem recorrer de todos os castigos que lhes são aplicados, bem como dos castigos que são aplicados aos seus atletas, por exemplo).
Assim, não vejo esta como sendo uma restrição inadmissivel a direitos fundamentais dos clubes, pois estou convicto de que outros interesses mais importantes saem salvaguardados.
E essa argumentação de que estamos a restringir direitos fundamentais dos clubes cai por terra se considerares que, perante uma decisão (aplicada por magistrados que fazem parte, em 1ª Instância do Conselho de Disciplina da Liga) o clube, não se conformando com ela pode recorrer para o Conselho de Justça da Federação, e depois poderá ainda recorrer para Instâncias Internacionais dessa decisão.
Ou seja, a decisão que é proferida não é inalterável, não fica o clube sem o direito de recorrer dela. O que se passa é que, perante estas questões desportivas, impede-se, pelos motivos acima referidos, que o clube venha entupir os Tribunais Comuns.
E isto é assim ainda por outro motivo; a admitirmos esse recurso para os tribunais comuns, estaríamos a conceder aos clubes pelo menos, só a nível interno, a possibilidade de haver 5!! decisões sobre a mesma situação (CD, CJ, TRib. Adm. e Fiscal, Trib Central Adm e Supremo Trib Adm, por exemplo), o que, tens de concordar se revelaria desajustado e uma manifesta desproporcionalidade face ao que se passa com as decisões importantes da vida de cada um de nós que, quando muito, terão 3 instâncias de decisão.
Questão diferente é a de sabermos se o caso Mateus tem carácter estritamente desportivo ou não (pois daí é que depende a possibilidade de recorrer aos tribunais comuns ou não).
E quanto a esta questão, na minha opinião, estás novamente enganado, e estás a ser vítima da contra-informação que todos os dias é lançada para a comunicação social pelos responsáveis do Gil Vicente.
O que eles procuraram impugnar no recurso que fizeram para o Trib Adm e Fiscal de Braga não foi a simulação do contrato de trabalho do Mateus com o Lixa, mas foi a decisão desportiva de impedir a inscrição do atleta na Liga de Clubes.
E tanto assim foi que, numa primeira fase, com o objectivo de procurar "tapar o sol com a peneira", o Gil veio dizer que tinha sido o jogador, e não o clube, a recorrer dessa decisão para os Tribunais comuns. Depois, não te podes esquecer que já houve dois órgãos compostos de magistrados superiores a entender que esta questão tinha carácter estritamente desportivo, e por isso, despromoveu o Gil Vicente.
Portanto, considero, que mesmo nesta questão particular não tens razão, não foi arguida qualquer simulação, nem se pretendeu (com o pedido feito nesse tribunal) que fosse declarada a simulação do contrato de trabalho previamente estabelecido entre Lixa e Mateus.
E tanto assim é que a decisão desse Tribunal, que só pode conhecer do pedido e não pode ir para além dele, decidiu unicamente quanto à regukaridade ou não da decisão de inscrever o Mateus, considerando que, face às normas desportivas em vigor ao nivel das inscrições, o Mateus não poderia ser inscrito.
Esta, para mim, é uma questão estritamente desportiva, o saber se um jogador pode ou não ser inscrito face às leis desportivas em vigor.
Assim sendo: questão estritamente desportiva + recurso aos tribunais comuns = despromoção do Gil Vicente.
Para terminar, e porque esta resposta já vai longa e depois não vais ter paciência para ler isto até ao fim, só queria ainda dizer que quando dizes que os árbitros não são juízes (na maioria das vezes até são, e mais ainda em termos desportivos - vê o CJ e o CD) e que a existência de juízos arbitrais não exclui a competência de tribunais soberanos, para estar inteiramente de acordo contigo faltou acrescentares que "a existência de juizos arbitrais não exclui, por si só, a competência dos Tribunais soberanos".
E este acrescento faz toda a diferença porque, como já disse, os juizos arbitrais juntamente com a renúncia ao recurso a tribunais comuns exclui a competência dos tribunais soberanos.
E é isso mesmo que acontece nestes casos desportivos, em que existem juizos arbitrais e existe ainda a renúncia ao direito de recorrer das decisões por eles proferidas de âmbito estritamente desportivo. E isto, tal como acontece em dezenas de situações, exclui a competência dos Tribunais soberanos.
Para finalizar, não se trata da falsa questão de não se poder recorrer das decisões desportivas tomadas por um órgão (como tu queres dar a entender quando falas da aberração que seria colocarmos uma cláusula num contrato que impedisse a discussão judicial do mesmo, obrigando o outro contraente a aceitar todos os termos do contrato sem discussão), porque essas questões são susceptiveis de recurso e de re-análise dentro da justiça desportiva, trata-se é de impedir que se possa recorrer quase ad eternum dessas questões.
Acho que não vale a pena continuarmos a discutir... Eu não vou mudar de opinião e já vi que tu também não. Hehehe Mas deixa-me fazer duas precisões:
ResponderEliminar1- Permitir aos clubes ir para a jurisdição administrativa, para contestar actos administrativos, não é dar-lhes mais graus de jurisdição que aos restantes cidadãos: todos os cidadãos têm a possibilidade de recursos hierárquicos (e é disso que se tratam os recursos para os órgãos jurisdicionais desportivos) e ainda o seu direito de recurso aos tribunais.
E mesmo que assim não fosse, não é por haver mais ou menos graus de recursos internos dentro de uma pessoa colectiva, pública ou privada, que pode privar-se qualquer cidadão de recorrer ao sistema jurisdicional nacional, independente e imparcial. É um direito fundamental.
2- Claro que o processo que motivou a descida do Gil foi uma impugnação de um acto administrativo, se calhar exprimi-me mal. Só que a fundamentação dessa impugnação era a simulação de um contrato de trabalho. Considerar a impugnação de uma decisão de um órgão não desportivbo da liga (nao estamos a falar de um árbitro!) com base numa figura jurídica - a simulação - uma matéria técnico-desportiva é coisa que me choca. E muito.
Por isso, digo e repito. O Gil deve ser punido se inscreveu mal um jogador. Até pela descida de divisão. Mas JAMAIS por ter exercido um direito que lhe é dado directamente pela Constituição.
O tempo dirá qual das nossas visões vingou...