quarta-feira, 31 de janeiro de 2007

IVG

A dirigente parlamentar do PS, Ana Catarina Mendes, veio garantir que, se a despenalização do aborto vencer no referendo, a lei regulamentadora a aprovar pela AR deverá estabelecer um mecanismo de decisão informada e ponderadapor parte das mulheres que desejem abortar. Só posso saudar esta decisão (que defendi no Programa "Prós e Contras"), esperando que ela venha a ser oficialmente confirmada pela direcção do PS e pelo Primeiro-Ministro. Assim se contraria de forma eficaz a acusação de "aborto a pedido" e de "aborto livre" que os adversários da despenalização têm brandido.

Inserido pelo prof. Vital Moreira, no blog Causa nossa

terça-feira, 30 de janeiro de 2007

Mário Soares admite vitória do NÃO

Mário Soares veio dizer que se o NÃO ganhar não é nenhuma tragédia. No fundo, começa a preparar o terreno para uma eventual segunda vitória do não.
Por mais agradável que a ideia seja, não me parece que se vá concretizar. Desta vez acredito que o SIM ganhe este referendo. Mas confesso que me conforta o facto de o SIM ter percebido que não é assim tão simples mudar a lei. E ter percebido que é uma questão tão fracturante que qualquer resultado vai deixar metade do país desiludido.
Por isso cada vez mais acredito: aditar uma alínea ao 142.º despenalizando o aborto por razões sócio-económicas seria não só a solução razoável como aquela que conseguiria um largo apoio do eleitorado e da sociedade (além de que é o modelo que tão bem tem funcionado em França, Inglaterra, Bélgica, etc.).

segunda-feira, 29 de janeiro de 2007

Uma família à beira de um ataque de nervos

Fui ver. Já tinha pensado ir, mas confesso que interesse se reforçou com a nomeação para os óscares.
Recomenda-se: bons diálogos, humor, subtileza e gargalhadas.

http://cinecartaz.publico.clix.pt/filme.asp?id=159695

É bom saber que viajo de forma segura para os Açores...



Um avião que saiu de Ponta Delgada com destino a Lisboa foi ontem obrigado a voltar para trás e a aterrar de emergência no aeroporto de Santa Maria, nos Açores. A bordo seguiam mais de 180 passageiros que estão desde ontem à noite à espera de um segundo voo.

Minutos após a descolagem, o Airbus 310 da companhia aérea SATA apresentou problemas no flat da asa direita, um componente que permite ao avião fazer as manobras em segurança.

A bordo seguiam 182 passageiros que cedo perceberam que o avião seguia com um inclinação fora do habitual.

Chegados a Santa Maria os passageiros foram hospedados em dois hotéis locais onde continuam a aguardar um segundo voo com destino a Lisboa.

À SIC a companhia aérea informou que foi necessário enviar do continente uma peça para reparar a avaria e garantiu que, se nada voltar a falhar, os passageiros poderão regressar a Lisboa às 16h00, hora local.

Fonte: Sic Online

Doze razões, por Vital Moreira

Vital Moreira, no Público:
Sou a favor da despenalização do aborto, nas condições e limites propostos no referendo, ou seja, desde que realizado por decisão da mulher, em estabelecimento de saúde, nas primeiras dez semanas de gravidez. Eis uma recapitulação das minhas razões.
1.ª - O que está em causa no referendo é decidir se o aborto nessas condições deve deixar de ser crime, como é hoje, sujeito a uma pena de prisão até 3 anos (art. 140.º do Código Penal). Por isso, é francamente enganador chamar ao referendo o "referendo do aborto" ou "sobre o aborto", como muita gente diz. De facto, não se trata de saber a posição de cada um sobre o aborto (suponho que ninguém aplaude o aborto), mas sim de decidir se a mulher que não se conforma com uma gravidez indesejada, e resolve interrompê-la, deve ou não ser perseguida e julgada e punida com pena de prisão.
2.ª - Não há outro meio de deixar de punir o aborto senão despenalizando-o. Enquanto o Código Penal o considerar crime (salvas as excepções actualmente já existentes), ninguém que pratique um aborto está livre da humilhação de um julgamento e de punição penal. Quem diz que não quer ver as mulheres punidas, mas recusa a despenalização, entra numa insanável contradição. Não faz sentido manter o aborto como crime e simultaneamente defender que ele não seja punido.´
3.ª - A actual lei penal só considera lícito o aborto em casos assaz excepcionais (perigo grave para vida ou saúde da mulher, doença grave ou malformação do nascituro, violação). Ao contrário do que correntemente se diz, a nossa lei não é igual à espanhola, que é bastante mais aberta do que a nossa e tem permitido uma interpretação assaz liberal, através da cláusula do "perigo para a saúde psíquica" da mulher. Por isso, a única saída entre nós é a expressa despenalização na primeira fase da gravidez, alterando o Código Penal, como sucede na generalidade dos países europeus.
4.ª - A despenalização sob condição de realização em estabelecimento de saúde autorizado (por isso não se trata de uma "liberalização", como acusam os opositores) é o único meio de pôr fim à chaga humana e social do aborto clandestino. Esta é a mais importante e decisiva razão para a defesa da despenalização. Nem a ameaça de repressão penal se mostra eficaz no combate ao aborto, nem a sua legalização faz aumentar substancialmente a sua frequência. A única coisa que se altera é que o aborto passa a ser realizado de forma segura e sem as sequelas dos abortos clandestinos mal-sucedidos. Por isso, se pode dizer que a legalização do aborto é uma questão de saúde pública.
5.ª - Se se devem combater os factores que motivam gravidezes indesejadas, é humanamente muito cruel tentar impô-las sob ameaça de julgamento e prisão. É certo que hoje há mais condições para evitar uma gravidez imprevista (contraceptivos, planeamento familiar, etc.). Mas a sociologia é o que é, mostrando como essas situações continuam a ocorrer, em todas as classes e condições sociais, mas especialmente nas classes mais desfavorecidas, entre os mais pobres e menos cultos, que acabam por ser as principais vítimas da proibição penal e do aborto clandestino (até porque não têm meios para recorrer a uma clínica no estrangeiro...).
6.ª - A despenalização do aborto até às 10 semanas é uma solução moderada e, mesmo, comparativamente "recuada", visto que em muitos países se vai até às 12 semanas. Por um lado, trata-se de um período suficiente para que a mulher se dê conta da sua gravidez e possa reflectir sobre a sua interrupção em caso de gravidez indesejada. Por outro lado, no período indicado o desenvolvimento do feto é ainda muito incipiente, faltando designadamente o sistema nervoso e o cérebro, pelo que não faz sentido falar num ser humano, muito menos numa pessoa. Como escrevia há poucos dias um conhecido sacerdote católico e professor universitário de filosofia: "A gestação é um processo contínuo até ao nascimento. Há, no entanto, alguns "marco" que não devem ser ignorados. (...) Antes da décima semana, não havendo ainda actividade neuronal, não é claro que o processo de constituição de um novo ser humano esteja concluído."
7.ª - Só a despenalização e a "desclandestinização" do aborto é que permitem decisões mais ponderadas e reflectidas, incluindo mediante aconselhamento médico e psicológico. Embora o referendo não verse sobre os procedimentos do aborto legal, nada impede e tudo aconselha que a lei venha a prever uma consulta prévia e um período de dilação da execução do aborto, como existe em alguns países. Aliás, o anúncio de tal propósito poderia ajudar o triunfo da despenalização no referendo, superando as hesitações daqueles que acham demasiado "liberal" o aborto realizado somente por decisão desacompanhada da mulher.
8.ª - A despenalização do aborto nos termos propostos não viola o direito à vida garantido na Constituição, como voltou a decidir o Tribunal Constitucional, na fiscalização preventiva do referendo. No conflito entre a protecção da vida intra-uterina e a liberdade da mulher, aquela nem sempre deve prevalecer. O feto (ainda) não é uma pessoa, muito menos às dez semanas, e só as pessoas são titulares de direitos fundamentais e, embora a vida intra-uterina mereça protecção, inclusive penal, ela pode ter de ceder perante outros valores constitucionais, nomeadamente a liberdade, a autodeterminação, o bem-estar e o desenvolvimento da personalidade da mulher. Mas a punição do aborto continua a ser a regra e a despenalização, a excepção.
9.ª - A decisão sobre a legalização ou não do aborto não pode obedecer a uma norma moral partilhada só por uma parte da sociedade. Ninguém pode impor a sua moral aos outros. É evidente que quem achar, por razões religiosas ou outras, que o aborto é um "pecado mortal" ou a violação intolerável de uma vida, não deve praticá-lo. Pode até empregar todo o proselitismo do mundo para dissuadir os outros de o praticarem. Mas não tem o direito de instrumentalizar o Estado e o direito penal para impor aos outros as suas convicções e condená-los à prisão, caso as não sigam. A despenalização do aborto não obriga ninguém a actuar contra as suas convicções; a punição penal, sim.
10.ª - A despenalização é a solução a um tempo mais liberal e mais humanista para a questão do aborto. Liberal - porque respeita a liberdade da mulher quanto à sua maternidade. Humanista - porque é o único antídoto contra as situações de miséria e de humilhação que o aborto clandestino gera. Quando vemos tantos autoproclamados liberais nas hostes do "não", isso é a prova de que o seu liberalismo se limita à esfera dos negócios e da economia, parando à porta da liberdade pessoal. Quando vemos tanta gente invocar o "direito à vida" do embrião ou do feto para combater a despenalização, ficamos a saber que para eles vale mais impor gravidezes indesejadas (e futuros filhos não queridos) do que a defesa da liberdade, da autonomia e da felicidade das pessoas. Se algo deve ser desejado, devem ser os filhos!
11.ª - Na questão da despenalização do aborto é verdadeiramente obsceno utilizar o argumento dos custos financeiros para o SNS. Primeiro, o referendo não inclui essa questão, deixando para a lei decidir sobre o financiamento dos abortos "legais". Segundo, mesmo que uma parte deles venham a ser praticados no SNS, o seu custo não deve comparar desfavoravelmente com os actuais custos da perseguição penal dos abortos, bem como das sequelas dos abortos mal sucedidos.
12.ª - A despenalização do aborto, nos termos moderados em que é proposta, será um sinal de modernização jurídica e cultural do país, colocando-nos a par dos países mais liberais e mais desenvolvidos, na Europa e fora dela (Estados Unidos incluídos). A punição penal do aborto situa-nos ao lado de um pequeno número de países mais conservadores e mais influenciados pela religião (como a Irlanda e a Polónia). Mas por que motivo um Estado laico deve pautar o seu Código Penal por normas religiosas?
(Público, Terça-feira, 23 de Janeiro de 2007)

domingo, 28 de janeiro de 2007

Dúvida sincera

Sabemos que a questão do aborto seria consensual se o Governo se tivesse limitado a propor uma causa de exclusão da punibilidade por razões sócio-económicas. Toda a gente estaria de acordo com uma despenalização nesse caso. Mas enfim, não foi isso que aconteceu, o que me suscita uma dúvida sincera:
Se, depois do dia 11 de Fevereiro, a mãe vai ter um livre direito a não ser mãe, porque é que o pai não pode ter um livre direito a não ser pai?
Se o pai não quiser o filho, porque tem de o suportar? O Princípio da Igualdade não implicará ou que se permita o aborto a pedido do pai (ainda que contra a vontade da mãe, pois esta tem também tem um direito ao aborto ainda que contra a vontade do pai) ou que se lhe admita não perfilhar uma criança? Estou errado?

Estou a ver uns pais a arrogar-se deste direito em Tribunal... E qui ça, a ganhar...

sábado, 27 de janeiro de 2007

Parabéns ao Devaneios e Desabafos.

Acho que estamos verdadeiramente de parabéns. Este espaço de discussão, porque fundado na amizade e no respeito, tem sido pautado pela maior elevação. Somos coerentes, respeitadores e detentores das mais diferentes opiniões. Mas expomo-las com serenidade e tentamos sempre entender as dos outros.
Por isso, Roque e MGM, é um verdadeiro prazer discutir convosco, ouvir e respeitar as vossas posições. Sou forçado a admitir que são os meus preferidos parceiros de discussão política. Não vos imagino a ridicularizar as opiniões dos outros ou gozar com elas. Discutimos com honestidade intelectual e sem recurso a inverdades.
E estas coisas também se devem dizer.
Ainda bem que existe o Devaneios e Desabafos. Espero que possamos continuar a discutir e a argumentar por muitos e bons anos.
Parabéns a nós!

terça-feira, 23 de janeiro de 2007

Referendo sobre o aborto

Anselmo BorgesPadre e professor de Filosofia


Numa questão tão delicada, com a vida e a morte em jogo, não se pretende que haja vencedores nem vencidos, mas um diálogo argumentado, para lá da paixão e mesmo da simples compaixão. Ficam alguns pontos para reflectir.
1. O aborto é objectivamente um mal moral grave. Aliás, ninguém é a favor do aborto em si, pois é sempre um drama.
2. A vida é um bem fundamental, mas não é um bem absoluto e incondicionado. Se o fosse, como justificar, por exemplo, o martírio voluntário e a morte em legítima defesa?
3. Para o aparecimento de um novo ser humano, não há "o instante" da fecundação, que é processual e demora várias horas.A gestação é um processo contínuo até ao nascimento. Há, no entanto, alguns "marcos" que não devem ser ignorados. É precisamente o seu conhecimento que leva à distinção entre vida, vida humana e pessoa humana. O blastocisto, por exemplo, é humano, vida e vida humana, mas não um indivíduo humano e, muito menos, uma pessoa humana.Se entre a fecundação e o início da nidação (sete dias), pode haver a possibilidade de gémeos monozigóticos (verdadeiros), é porque não temos ainda um indivíduo constituído.Antes da décima semana, não havendo ainda actividade neuronal, não é claro que o processo de constituição de um novo ser humano esteja concluído.
De qualquer modo, não se pode chamar homicídio, sem mais, à interrupção da gravidez levada a cabo nesse período.
4. Sendo o aborto objectivamente um mal, deve fazer-se o possível para evitá-lo. Tudo começa pela educação e formação. Impõe-se uma educação sexual aberta e responsável para todos, que, não ficando reduzida aos aspectos biológicos e técnicos, tem de implicá-los, fazendo parte dela o esclarecimento, sem tabus, quanto à contracepção.
5. O aborto é uma realidade social que nem a sociedade nem o Estado podem ignorar. Como deve então posicionar-se o Estado frente a essa realidade: legalizando, liberalizando, penalizando?
6. Não sem razão, pensam muitos (eu também) que, se fosse cumprida, a actual lei sobre a interrupção da gravidez, permitida nos casos de perigo de morte ou grave e duradoura lesão para a mãe, de nascituro incurável com doença grave ou malformação congénita e de crime contra a liberdade e autonomia sexual (vulgo, violação), seria suficiente.
7. De qualquer forma, vai haver um referendo. O que se pergunta é se se é a favor da despenalização do aborto até às dez semanas, em estabelecimentos devidamente autorizados, por opção da mulher.Por despenalização entende-se que, a partir do momento em que não há uma pena, a justiça deixa de perseguir a mulher que aborta e já não será acusada em tribunal. Aparentemente, é simples. Mas compreende-se a perplexidade do cidadão, que, por um lado, é a favor da despenalização - despenalizar não é aprovar e quem é que quer ver a mulher condenada em tribunal? -, e, por outro, sente o choque de consciência por estar a decidir sobre a vida, realidade que não deveria ser objecto de referendo. O mal-estar deriva da colisão dos planos jurídico e moral.
8. Impõe-se ser sensível àquele "por opção da mulher" tal como consta na pergunta do referendo, pois há aí o perigo de precipitações e arbitrariedades. Por isso, no caso de o "sim" ganhar, espera-se e exige-se do Estado que dê um sinal de estar a favor da vida.Pense-se no exemplo da lei alemã, que determina que a mulher, sem prejuízo da sua autonomia, deve passar por um "centro de aconselhamento" (Beratungsstelle) reconhecido.
Trata-se de dialogar razões, pesar consequências, perspectivar alternativas. A mulher precisará de um comprovativo desse centro e entre o último encontro de aconselhamento e a interrupção da gravidez tem de mediar o intervalo de pelo menos três dias. As custas do aborto ficam normalmente a cargo da própria.
O penalista Jorge Figueiredo Dias também escreveu, num contexto mais amplo: "O Estado (...) não pode eximir-se à obrigação de não abandonar as grávidas que pensem em interromper a gravidez à sua própria sorte e à sua decisão solitária (porventura na maioria dos casos pouco informada); antes deve assegurar-lhes as melhores condições possíveis de esclarecimento, de auxílio e de solidariedade com a situação de conflito em que se encontrem. Sendo de anotar neste contexto a possibilidade de vir a ser considerada inconstitucional a omissão do legislador ordinário de proporcionar às grávidas em crise ou em dificuldades meios que as possam desincentivar de levar a cabo a interrupção".
As razões do Assim Não

Foi exactamente o que aqui escrevi a 19 de Outubro de 2006...

CIA: Comissão insta Portugal a prosseguir investigações

http://diariodigital.sapo.pt/news.asp?section_id=12&id_news=259491

segunda-feira, 22 de janeiro de 2007

O caso da Ana Filipa

Factos apurados na sentença que já pus no nosso blog:

1. A Esmeralda nasceu no dia 12 de Fevereiro de 2002;
2. Em 28 de Fevereiro de 2002, a Mãe da Esmeralda entregou-a ao casal Luís Gomes e Adelina Lagarto;
3. A Mãe registou a menor, tendo ficado omissa a menção de paternidade;
4. Consequentemente, foi iniciado uma Averiguação Oficiosa de Paternidade, que corre oficiosamente e que é conduzida pelo Ministério Público;
5. Nesse processo de averiguação oficiosa de paternidade logo em 17 de Fevereiro de 2002, Luís Baltasar, declarou que, se testes hematológicos revelassem ser o Pai da criança, assumiria a paternidade, perfilhando-a;
6. Em Fevereiro de 2003, testes hematológicos confirmaram que o Luís Baltasar era efectivamente o Pai, que, de imediato, perfilhou a menor;
7. A partir desta data, procurou a menor junta da Mãe, que a tinha supostamente em seu poder, no entanto aquela com informações erróneas e equívocas, ocultou ao Luís Baltasar o paradeiro da menor, tendo aquele após sucessivas insistências junto do M.P. da Sertã, vindo a saber que a filha se encontrava a residir com os demandados em Torres Novas, desconhecendo contudo na altura as circunstâncias e motivos de tal situação;
8. Logo que conhecido o local onde se encontrava a filha, o Luís Baltasar procurou-a na casa de residência do referido casal;
9. No entanto, contactado o casal, primeiro telefonicamente e depois pessoalmente, nunca estes permitiram, que contactasse com a filha, não o recebendo, mantendo para tanto a porta fechada exterior, conquanto para o fim vezes houve que viu serem desligados as luzes, não reagindo ao toque da campainha.
Pronto, assentes estes factos, vamos então discutir.

Despacho na NET

Eis o editorial do DN de hoje, assinado pelo Jornalista Eduardo Dâmaso:

O primeiro despacho produzido por Maria José Morgado sobre um caso de alguma substância, o inquérito que envolve o presidente do FC Porto, foi publicado na Internet. Trata-se de uma grosseira violação do segredo de justiça e obriga a Procuradoria-Geral da República a ordenar a abertura de um inquérito. Uma investigação que também obriga a Ordem dos Advogados a seguir o caso com atenção, pois o despacho da procuradora já era do conhecimento das defesas dos arguidos desde quarta e quinta-feira passadas.

Este pormenor é importante para que o debate público sobre este caso não se faça exclusivamente em função do apuramento de eventuais responsabilidades da equipa de Maria José Morgado. É óbvio que aqui há pelo menos alguma paridade ao nível das responsabilidades potenciais pela divulgação do documento, sendo que o crime aproveita de forma muito diferente a uns e a outros...

O debate sobre o segredo de justiça tem sido excessivamente centrado nas responsabilidades de jornalistas, magistrados e polícias. É preciso ter a consciência de que este é também um debate que pode e deve vincular os advogados.
Para lá da violação do segredo de justiça, este episódio ilustra bem os problemas que a equipa de Morgado vai ter pela frente. Passada a fase dos elogios, já está a chegar a tormenta da pressão, da erosão sobre o trabalho da sua equipa, até aqui suficientemente discreta para se blindar de críticas habituais a quem investiga casos complexos, e que Maria José Morgado bem conhece, como protagonismo, exacerbação de poderes, etc., etc...

Joga-se muito no sucesso ou insucesso de Morgado e esse jogo não se circunscreve sequer aos arguidos deste processo. Joga-se o futuro modelo de organização do Ministério Público em matéria de acção penal, ou seja, a questão de saber se uma estrutura como o DCIAP é para continuar ou é substituída por equipas pontuais, com lideranças pontuais, para casos pontuais. Joga-se o reforço ou a aniquilação do "mito" que Maria José Morgado já representa na opinião pública. Jogam-se os termos da relação futura entre poder político, poder judicial e poder do futebol, com alguns protagonistas do poder económico a correr por fora, em particular alguns empreiteiros, mas com manifestos interesses a defender.
Tudo o que já antes se tinha visto no caso "Apito Dourado" e que deu na inacreditável crise da PJ do Porto. Com grandes responsabilidades de governantes, à época de Durão Barroso, magistrados e polícias, equipa de Adelino Salvado na PJ e o próprio Ministério Público sob a liderança de Souto Moura. Repetir uma coisa assim seria um verdadeiro pesadelo!

domingo, 21 de janeiro de 2007

O mau serviço de Paulo Camacho

Lamentável. Ontem o pivot do Jornal da Noite da SIC, Paulo Camacho, recebeu em directo um representante da associação sindical dos juízes, que se insurgiu com a desinformação que a Comunicação Social tem passado no caso de Torres Novas, a que a MGM já aludiu.
Em vez de deixar o Magistrado expor o que realmente se passava (a quem tratava por você, o que já de si é profundamente revelador...), deturpou escandalosamente as suas palavras, cortando-lhe a palavra de forma inacreditável e tirando conclusões que só um populismo inaceitável justifica.
Para noticiário, ficámos mal. Entre a controlada pelo Governo RTP, e as populistas privadas, mais vale ler o jornal no dia seguinte...

Não deixar por mãos alheias

No site que aqui identifico consta a sentença do Tribunal Judicial da Comarca de Torres Novas, mais conhecida por "sentença do militar".
Leitura obrigatória.
Mais uma vez: nada é o que parece!
http://www.verbojuridico.net/

Hillary Clinton anuncia candidatura à presidência dos EUA

http://diariodigital.sapo.pt/news.asp?section_id=10&id_news=259142

sexta-feira, 19 de janeiro de 2007

Direitos Humanos

Mais uma afirmação da prevalência dos direitos humanos básicos em tempos de insegurança e terrorismo.

Luso-americano indemnizado após ter sido expulso de avião
http://tsf.sapo.pt/online/vida/interior.asp?id_artigo=TSF177019

quinta-feira, 18 de janeiro de 2007

Razões de um NÃO responsável.

Já não suporto, não aguento, não tenho capacidade intelectual nem emocional para falar mais do Aborto. E não voltarei a fazê-lo. Pela última vez escreverei agora as razões pelas quais me parece que, jurídica e socialmente, só o voto no NÃO é legítimo, procurando ainda desmontar os argumentos do Sim.

1. A vida humana é reconhecida deste a concepção pelo direito.
A personalidade jurídica começa no momento do nascimento completo e com vida. Mas a personalidade jurídica não se confunde com a personalidade humana nem com a tutela que o direito faz à personalidade humana. Com efeito, um nascituro já concebido goza de direitos de natureza pessoal e patrimonial: pode ter já património, pois é possível deixar em testamento bens a um nascituro; goza de direitos de personalidade, como o direito à honra, à dignidade, à imagem, etc. Se forem violados, o nascituro tem um direito próprio a ser indemnizado.
Ora, se assim é, não é juridicamente coerente conferir todos os direitos de personalidade ao nascituro negando-lhe depois o direito mais fundamental (o direito à vida), entendendo que é a mãe quem livremente optará por conferir-lho ou não!
A liberalização do aborto implicaria, pois, uma total alteração do sistema jurídico, na medida em que não podemos entender o nascituro como sujeito de direitos e obrigações enquanto ser autónomo e depois vir admitir que é a mãe quem decide sobre a vida do feto, como se não existisse vida autónoma. A admitir o aborto livre, há que excluir todos os outros direitos de índole pessoal e patrimonial que o sistema jurídico já consagra à vida intra-uterina.


2. Se admitimos que o feto é vida humana, não podemos admitir o aborto.
Se o feto é considerado sujeito autónomo de direitos e deveres (coisa que ninguém discute), não pode haver razão alguma que justifique o livre acto abortivo. A liberdade da mãe termina no ponto em que começa a liberdade de outrem. Ora, se admitimos que o feto tem direitos próprios, não podemos deixar a um terceiro (a mãe) que opte livremente quanto à sua vida. Porque se assim for, que diferença há entre um feto com 10 semanas e um com 20? Já é vida às 20 e não é às 10? Porquê? Onde está a diferença? É que às 8 semanas é possível determinar o sexo do bebé; às 10 semanas há um coração a bater...
Sermos coerentes é admitir, então, o aborto enquanto o feto estiver dentro do útero.
E mais uma vez pergunto: qual é a diferença entre um feto dentro do útero e uma criança recém-nascida? A dependência da mãe verifica-se nos dois casos. E, então, porque não admitir que a mãe possa matar o recém-nascido quando não tenha condições para lhe dar uma vida decente e íntegra?
A coerência admiti-lo-ia!
Nenhum dos actos é possível porque a mãe não tem legitimidade para decidir sobre a vida de outrem. Seja boa ou má, a vida não é sua, não está na livre disponibilidade da mulher (já chegarei às causas admitidas de aborto...)


3. Não se trata de uma despenalização mas de uma liberalização.
A despenalização consiste na descriminalização de uma conduta que continua a ser proibida. Exemplo: despenalização do consumo de drogas leves. Deixou de ser crime, continua a ser proibido, punido por uma coima, ao nível do direito administrativo.
Aqui discute-se uma liberalização: está em causa saber se o aborto pode ser permitido, livre, até às 10 semanas. Mais, se o Estado deve providenciar o aborto livre até esse momento.
Questão: porque é que a pergunta é "despenalização" e não "liberalização" quando é disto que se trata?


4. Trata-se de "Aborto" e não de "Interrupção Voluntária da Gravidez".
O que está em causa neste referendo é a alteração de um artigo do Código Penal onde se prevê a punição do crime de aborto. É isso que se discute.
Questão: se está em discussão uma norma sobre "Aborto", porque é que a pergunta é sobre "IVG"?


5. Admitir as causas permitidas de aborto e rejeitar o aborto livre não é ser incoerente.
O Código Penal não é uma compilação de normas prevendo crimes específicos. Essa é uma parte do Código Penal, a parte especial. Além da parte especial existe uma parte geral, com disposições a ser aplicadas em todos os crimes.
Ora, um dos princípios da parte geral é o princípio da culpa como limite inultrapassável da punição, bem como o da culpa enquanto pressuposto essencial da punição. Se não houver culpa, não pode haver pena; se a culpa for diminuta, a pena será diminuta.
É por isso que quem roubar para comer ou, melhor, quem roubar para dar de comer aos filhos, não tem qualquer punição! Actuou num "estado de necessidade desculpante", isto é, entende-se que apesar de ter praticado um facto tipificado como crime, não é censurável, reprovável, a sua conduta. Razão pela qual não há pena.
Da mesma forma, há causas de exclusão da ilicitude: se alguém entrar em minha casa para me matar e eu, para me defender, matar o atacante, não serei punido porque agi em legitima defesa. Isto é, entende-se que a minha conduta nem sequer é ilícita, nem sequer é anti-jurídica, pois agi com o intuito de proteger um bem jurídico de valor igual ou superior ao que violei (violei o bem "vida do asaltante" para proteger um de igual valor "minha vida").
Assim, as três causas permitidas de aborto NÃO TINHAM de estar expressamente previstas na parte especial, no concreto artigo referido ao crime do aborto. Isso resultaria da parte geral.
Ainda assim, o legislador entendeu dever explicitá-las.
1- Perigo de Vida da Mulher: É claramente uma causa de exclusão da ILICITUDE. Admite-se que o aborto é lícito porque se pratica com o intuito de proteger outro bem jurídico de valor igual ou superior. Viola-se o bem jurídico "vida do feto" para proteger o bem jurídico "vida da mãe".
2- Violação: Há quem entenda que também aqui se trata de uma causa de exclusão da ilicitude. Considera-se lícito o aborto (violar o bem jurídico "vida do feto") para proteger outro bem jurídico que foi atacado ("auto-determinação sexual da mulher"), de valor igual ou superior.
Por minha parte, parece-me que se trata de uma exclusão da culpa. Isto é, a mulher pratica o facto tipificado como crime mas não é punida porque não há reprovabilidade na sua conduta, entende-se compreensível que a mulher o faça.
3- Mal formação do feto: Exclusão da culpa: a mulher pratica o facto tipificado como crime mas não é punida porque não há reprovabilidade na sua conduta, entende-se compreensível que a mulher o faça, não a sujeitando a uma pena que exprime censurabilidade social.

Pois que incoerência existe em admitir a NÃO PUNIÇÃO da mulher nestes casos e defender a protecção penal quanto ao aborto livre? Nenhuma! É coerente o nosso pensamento.
E não é só o nosso: mesmo a lei francesa, que é apontada pelos defensores do SIM como lei modelo, admite o aborto em caso de "angústia da mulher". Acredito que na prática seja exactamente a mesma coisa que um aborto livre, mas do ponto de vista jurídico há uma grande diferença: é que, em França, entende-se que o aborto é crime, embora em caso de angústia da mulher se exclua a culpa. Não há punição porque, em caso de angústia se entende que não há reprovabilidade da sua conduta.


6- Não é incoerente querer a lei em vigor e não querer mulheres na prisão.
O direito penal não serve para castigar, não serve para aplicar castigos a quem se porta mal. Esse papel caberá a muitas ordens mas não ao Estado. O direito penal serve para prevenir a violação de bens jurídicos. A melhor norma de direito penal será aquela que nunca foi aplicada, pois é sinal que conseguiu prevenir a prática do crime.
Quando não conseguiu prevenir a prática do crime (prevenção geral negativa), a norma penal impõe uma punição, mas não para castigar ou para infligir um mal (finalidade ético-retributiva).
O direito penal aplica uma punição com finalidades preventivas: reintegrar a norma violada, isto é, dar um sinal à sociedade que a norma violada continua em vigor, mas PRINCIPALMENTE ressocializar o agente do crime, isto é, dar-lhe as condições para que possa prosseguir a sua vida sem cometer mais crimes (prevenção especial positiva). Ou seja, a pena a aplicar em cada caso vai ter como função ressocializar o agente, pelo que só será necessária quando o agente tenha necessidades de ressocialização.
Por outro lado, a pena a aplicar terá como limite a culpa da mulher: ora, é facilmente conjecturável que, muitas vezes, não haja um juízo de censurabilidade da mulher que abortou, se o fez em circunstâncias que tornam não reprovável a sua conduta.
Ora, assim sendo, é perfeitamente coerente querer a norma em vigor e intimamente desejar que ela não implique a prisão de mulheres: só implicará se a atitude da mulher for culposa, censurável, e se esta revelar necessidades de ressocialização.
Isso é muito diferente de aceitar um aborto livre, a pedido, sem qualquer razão.


7- A protecção penal do aborto é necessária:
O direito penal só deve intervir quando seja estritamente necessário, isto é, quando nenhum outro ramo do direito conseguir proteger eficazmente o bem jurídico que tenha dignidade penal. Se ninguém discute que o bem jurídico (vida) tem dignidade penal, é já discutível se deve o direito penal intervir, por razões de eficácia. Isto é, se for encontrada uma qualquer outra forma de prevenir o aborto, está deslegitimada a intervenção do direito penal.
Ora, pergunto eu: além do direito penal, que outra forma pode eficazmente prevenir o aborto? Coimas de 30 a 3000 euros? Não me parece... Por isso digo: arranjem-me por favor uma forma de prevenção do aborto.


8- Os circos mediáticos vão continuar mesmo depois do SIM ganhar.
Aqueles lamentáveis circos mediáticos à volta dos tribunais onde decorriam julgamentos pelo crime de aborto e que humilhavam profundamente as mulheres visadas vão continuar. É que todos esses julgamentos eram por abortos cometidos depois das 1o semanas, factos que vão continuar a ser crime.
Que passo vem a seguir?


9- A lei a votar desrespeita profundamente a vida humana.
Antes de me insultarem, queria só alertar que me vou referir ao que a lei permitirá, não o que vai acontecer.
A lei que vai ser aprovada depois do referendo vai permitir que uma mulher vá ao Hospital e diga "Engravidei agora, mas já tenho férias marcadas para Agosto e não me dá jeito nenhum estar de 8 meses nessa altura. Faça-se o aborto". Ou que diga: "estou grávida de uma menina. Como queria um rapaz, vou abortar".
Não estou, obviamente, a dizer que isto vai acontecer, pois espero sinceramente que não. Só estou a dizer que a lei o permite, pois liberaliza qualquer aborto a pedido da mulher. E o facto de a lei o permitir é, para mim, profundamente chocante.


10- O facto de haver aborto clandestino não é argumento.
Aborto clandestino, claro que há. Outros crimes praticados clandestinamente, claro que há - roubos, furtos, homicídios, violações.
O argumento da liberalização do aborto porque ele existe de qualquer forma pode ser aplicado a qualquer crime. Como existem homicídios de qualquer forma, vamos liberalizar. Como existem furtos de qualquer forma, vamos liberalizar.
Não pode ser esse o critério. O critério só pode ser um: é ou não tutelável o bem jurídico "vida intra-uterina".


11- O aborto clandestino não vai acabar.
O aborto clandestino manter-se-á, pois o grande atractivo daquele é precisamente o facto de ser clandestino. Permitir o aborto livre não será motivo para que muitas mulheres continuem a fazer abortos secretamente, não querendo identificar-se num estabelecimento público ou privado de saúde.


Estas são sumariamente (se me lembrar de mais alguma, aditarei) as razões do meu NÃO responsável que me parece a única resposta coerente e juridicamente legítima.

E foi a última vez que falei disto.

sexta-feira, 5 de janeiro de 2007

Manifestações no Porto pela rede dos STCP

O notável fenómeno de protesto a que assistimos todos os dias no Porto como protesto contra a reformulação da rede de transportes públicos é uma realidade estranha. Aquilo que é um gravíssimo problema para uns é um disparate incompreensível para outros.
Certo é que a população que sente na pele aquele problema se mobilizou e, de forma mais ou menos discutível, tem demonstrado o descontentamento e tudo se conjuga para se lhes dar provimento.

PS: Nota-se muito que estou com ciúmes, dada a inexistência de qualquer queixa face ao fim da Ecovia?

Ass. Afonso, o mais recente utilizador de trolleys (é assim que se escreve?) que levam 40 minutos a deixar-me na Universidade...

Voos da CIA

A questão dos voos da CIA não é uma questão de lana caprina.
Saber se no século XXI, activamente ou por omissão, Portugal pactuou com abomináveis violações dos mais elementares direitos humanos, não é uma questão de somenos.
E confesso que, como cidadã, me interessa especialmente, saber se o meu poder político teve, ou não, nisso alguma participação. Não é apenas pelo argumento sedutor de que, tal como ao Eng. Canadiano, também eu posso "desaparecer" do aeroporto, ficar meses presa, sem acesso a um advogado ou saber do que, em concreto, me acusam. A condenação da tortura, as garantias de defesa e o respeito pelos direitos fundamentais são conquistas civilizacionais - ao que tudo aparenta ainda frágeis - que de que é preciso cuidar.
É, pois, uma questão de princípio, saber se pactuámos ou não com tal infâmia.