Depois de tanta polémica, de tantos protestos (dos quais resultaram várias fatalidades) e dos nervosos pedidos de desculpa do primeiro-ministro dinamarquês, eu não tinha outra hipótese. Tive de ir procurar os famosos cartoons.
E devo dizer que tal tarefa se revelou extraordinariamente difícil. Apesar de sempre ter ouvido falar em vários cartoons, apenas consegui encontrar estes dois.
A minha primeira reacção foi de profunda desilusão. Considerando as reacções que despoletou, eu esperava que Maomé fosse descrito como sendo o Anti-Cristo ou a encarnação de todo o mal.
Ainda assim compreendo que os membros da religião muçulmana considerem estas caricaturas de profundo mau gosto e, até, chocante. Afinal, estamos a falar do seu profeta, do portador da palavra sagrada, da mais alta figura da sua igreja.
O que me parece inaceitável é o ponto a que os protestos chegaram.
Ninguém discute o direito da comunidade muçulmana de se manifestar como entender (desde que o faça pacificamente) ou de fazer chover sobre o seu autor as mais variadas críticas.
Mas não há justificação possível para ameaçar de morte os dinamarqueses (muitos dos quais estão, de uma forma absolutamente admirável, a prestar auxílio às populações àrabes sem qualquer coimpensação), para ameaçar o ocidente com a eclosão da III Guerra Mundial, para atacar embaixadas ou para queimar bandeiras dinamarquesas.
E o pior de tudo foi a reacção dos governantes ocidentais que, influenciados por um injustificado sentimento de culpa relativamente às operações no Afeganistão e no Iraque e por um desejo de manter a paz (especialmente no seus próprios territórios internos) com esta força capaz de mobilizar milhões, apressaram-se a pedir desculpas e a assumir a responsabilidade por uma falta que, na verdade, não cometeram.
Esta é precisamente a oportunidade por que alguns esperavam para, capitalizando nos sacrifícios das massas menos instruídas e mais influenciáveis, tentar impor os seus valores ao ocidente.
Exemplo claro disso é a exigência (surreal) que o Hamas fez para mediar o conflito: um pedido formal de desculpas dos países ocidentais, acompanhado da aprovação de leis que restrinjam a liberdade de imprensa.
A simples sugestão de tal medida deveria ter feito soar alarmes nas mentes de todos nós.
Tudo isto adquire contornos ainda mais grotescos quando lemos nos jornais que "Foi só depois de um encontro da Organização da Conferência Islâmica que as caricaturas de Maomé publicadas num jornal dinamarquês se transformaram numa crise. As manifestações da ira muçulmana foram coordenadas por regimes interessados em travar pressões ocidentais para se democratizarem".
Parece-me evidente que não podemos perder de vista os valores que norteiam a nossa civilização e ceder a este tipo de chantagens.